quinta-feira, 28 de julho de 2011

FLUTUAÇÃO

Quando nascemos? Quando começamos a perceber que existe um mundo fora de nós? Por certo isso acontece bem antes do parto mesmo antes de conhecermos a gravidade terrestre que só nos é apresentada quando a bolsa materna rompe e paramos de flutuar. Porem, aquela sensação de não possuir peso nos acompanha por toda a vida como algo maravilhoso pelo qual passamos então a vida toda procurando recriar.
A lembrança remota da flutuação, guardada bem no fundo da nossa mente, faz com que todos os nossos pensamentos fiquem impregnados por esta doce sensação de não possuir peso. Por isso, existem pensamentos que parecem nos tirar do chão, que nos permitem caminhar como se os pés não estivessem tocando o solo. Outros pensamentos nos aterram e podem nos imobilizar, são capazes de provocar cegueira, mudez, riso ou choro. Acho que os dois pensamentos têm como referencial a flutuação que conhecemos durante a nossa gestação.
É certo que nenhum pensamento consegue nos fazer levitar. Jamais pensamento algum do homem conseguiu contrariar qualquer lei da física, mas por certo a fantasia da flutuação foi a inspiração de muitas descobertas ocorridas entre as curvas da estrada do conhecimento que nos trouxe até aqui.
Nunca ninguém flutuou no ar. Não que não tenha sido tentado por magos, druidas, santos, querubins e mágicos enganadores. Muitos tentaram convencer que eram capazes de levitar, mas o resultado é sempre o mesmo, ilusionismo.
Somos assim, portadores de uma mensagem invisível criada durante a nossa gestação na barriga das mães, que nos impele a querer contrariar a gravidade com o pensamento. Sem duvida nosso habitat contribui em muito com estes pensamentos rebeldes contra a gravidade, visto que a natureza parecendo querer nos atiçar faz com que coisas flutuem bem na frente dos nossos olhos e ao percebermos, nos excitamos com o desejo de imitá-la.
A compulsão humana do desejo de flutuar, cria interpretações para o fenômeno extremamente adequadas ao seu desejo. Assim, muita definição natural tem a falsa aparência do supranatural. Olhem como definimos flutuação cientificamente:
Flutuação é a condição em que se encontra um corpo dentro de um líquido quando este corpo tem a sua densidade igual a do líquido. Flutuação é também a condição que pode se encontrar uma bateria elétrica carregada quando esta se encontra ligada á uma fonte de energia de mesmo tensão. Quase mesma coisa e nas duas vezes o fenômeno nos instiga a querer realizar o desejo oculto de flutuarmos. Tambem as nuvens no céu nos arrebata.
O inglês Isaac Newton flutuou seus pensamentos magistralmente. No ano de 1.687 Newton publicou um livro com a interpretação de gravidade. Uma escorregadela foi a sua frase: - Matéria atrai matéria. Mas fora isso, o magnífico templo intelectual construído por Newton, tinha como alicerce a gravidade, grande algoz da nossa flutuação.
Passaram-se mais de trezentos anos e a população do planeta de Newton ultrapassou ao incrível número de seis bilhões de pessoas. Quantas destas pessoas compreendem bem o conceito de gravidade? Muito poucos, ainda mais com as lapidadas que foram dadas no conceito.
Newton navegou num mar desconhecido, onde ele não tinha se quer estrelas para se guiar. Tinha a liberdade de construir sua obra com as ferramentas que escolhesse e escolheu a flutuação.
Seus pensamentos tiravam o fôlego, tinham sobre todos os efeito de quem perdeu o chão sob os pés, era desconcertante.
Os homens de ciência da época torceram o nariz e acharam aquela construção de pensamento inverossímil e não aprovaram. Não parecia uma verdade sólida e bem plantada.
Um bom homem de ciência nunca deixa seu pés ficarem presos no chão ou soltos no ar, então, criou uma estrutura de pensamento matemático que chamou cálculo diferencial e integral e provou de novo. Provou de um jeito onde a exatidão da dedução superava a lógica de uma maneira irredutível convincente e terrena. Não sobrou alternativa e começou então o esforço pela compreensão dos novos andares no templo dos números.
A ferramenta racional criada por Newton tinha-se revelado polivalente e servia como uma luva em todas as outras correntes do pensamento científico do homem. Aquele trecho da estrada estava acabado e para sempre seria assim. Por ali haveria de seguir a humanidade por muito tempo. O primeiro método faleceu.
Alguém um dia em algum lugar falou assim: - E aquele outro jeito? Aquele negócio de flutuação? Pensadores, intelectuais, amantes da física começaram a cavoucar no método da flutuação de Newton. Foi quando o pasmo se fez. Era muito mais simples mais adequado para desenvolver o pensamento e encontrar a mesma solução, só que já era tarde. Mas no que consistia o método de flutuação de Newton? Ora, é a maneira de chegar à conclusão usando o mínimo de evidências possíveis. Pulando etapas onde a demonstração é muito complicada ou impossível, adotando ali uma resposta inevitavelmente correta. É um método onde o pensamento rejeita os paradigmas de um sistema bipolar. É um pensamento centrado e que não se subordina ao racionalismo.
Vou dar um exemplo de pensamento flutuante com um interrogatório onde uns grupos de pessoas buscassem um consenso de culpa para um acusado chamado Sebastião.
Alguem foi assassinada num apartamento ás 22h de um determinado dia. Neste mesmo dia ás 22,10h viram o Sebastião sair correndo pela porta do edifício. Este fato basta para condenar o Sebastião? E se o Sebastião fosse um bombeiro e estivesse atendendo a um chamado?
A pessoa morta tinha sido esfaqueada e o Sebastião estava com uma faca na mão. Basta para condenar o Sebastião? E se o Sebastião tivesse achado a faca no corredor?
Alguém no corredor viu o Sebastião saindo de dentro do apartamento onde estava a vítima com a faca na mão. Basta para culpar o Sebastião? E se tivesse outra pessoa dentro do apartamento onde houve o homicídio?
Alguém viu o Sebastião esfaqueando a vítima. Basta para condenar o Sebastião? E se o Sebastião tivesse sido intencionalmente drogado e induzido a cometer o crime?
Se o Sebastião confessasse o crime? Basta para condenar o Sebastião? E se o Sebastião fosse demente?
Há um momento do interrogatório que se adota a culpa ou a inocência do Sebastião sem margem de erro. O método que se deve usar no interrogatório é o da flutuação.
Flutuação é a quantidade de evidências mínimas necessária para deduzir o certo. Para uns é mais e para outros é menos. Flutua.
Somos acostumados a usar o método da flutuação na maioria dos nossos problemas. Em telecomunicação então, nem se fala.
A medicina do leigo é flutuante. A física do leigo é flutuante. A justiça do leigo é flutuante. O amor é flutuante. As religiões com sua fé são flutuantes.
Dedução, demonstração, reducionismo, prova, igualdade, perfeição, são características dispensável nas telecomunicações para um técnico intuitivo. Elas existem e é necessário para quem apreciar desenvolve-las, mas para muitos que manuseiam as telecomunicações, bastam as flutuações.
Os artistas foram os mais bem sucedidos no uso das flutuações. O avião foi desenhado por Da Vince séculos antes da possibilidade tecnológica de construí-lo. O submarino foi romanceado por Júlio Verne em livro dezenas de anos antes de haver tecnologia capaz de construir. Ainda não fazemos tele transporte de pessoas, mas fazemos de partículas.
Artistas, mágicos e cientistas, são três entes bem acoplados. Um sonha o outro desafia o outro prova. Nós? Nós flutuamos.
Flutuamos quando a música nos arrebata os ouvidos, flutuamos quando os bailarinos na ponta dos pés nos arrebatam os olhos, flutuamos num jardim quando o odor das flores nos arrebata o olfato, flutuamos no primeiro beijo de amor quando o toque nos arrebata na boca da amada. Talvez a maior prova que o homem poça vir a flutuar aconteça no momento exato da sua concepção, quando o amor ejacula o desejo arrebatador mais bonito da mente humana, o de criar outra vida flutuante, pois naquele momento perpetuamos e o perpétuo não pode estar preso no solo.
Há um instante muito pequeno na vida de todos nós quando o quase impossível acontece, um único e singular momento em que somos criatura e criador, sem dúvidas os pensamentos que se ejetam da nossa mente durante a fecundação da vida, superam a gravidade, pois neste momento tudo flutua. Para mim esta é a resposta, este é o momento exato do nascimento.


FIM

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